
Poesias de Lya Luft - Página 2

Lya Fett Luft (Santa Cruz do Sul, 15 de setembro de 1938) é uma escritora, tradutora e colunista brasileira. No total, já escreveu e publicou pelo menos 23 livros, entre romances, coletâneas de poemas, crônicas, ensaios e livros infantis e suas obras continuam sendo traduzidas para diversos idiomas. Ela considera que a sua literatura sempre nasceu do conflito, da dificuldade, do isolamento, portanto não é baseada em uma forma simples, previsível.
(Resumido e adaptado da Wikipédia)
Índice
Dança Lenta;
Dizendo Adeus;
Guardei-me para Ti;
Ilhas;
Mar de Menina;
Rio do Tempo;
Semântica;
Tão Sutilmente em Tantos Breves Anos;
Todas as Águas;
Um Anjo Vem.
Dança Lenta
Não somos nem bons nem maus:
somos tristes. Plantados entre chão
e estrelas, lutamos com sangue,
pedras e paus, sonho
e arte.
Nem vida nem morte:
somos lúcida vertigem,
glória e danação. Somos gente:
dura tarefa.
Com sorte, aqui e ali a ternura
faz parte.
(Em "Para não dizer adeus", 2005)
Dizendo Adeus
Estou sempre dando adeus:
também ao desencontro e ao
desencanto.
Estou sempre me despedindo
do ponto de partida que me lança de si,
do porto de chegada que nunca é
aqui.
Estou sempre dizendo adeus:
até a Deus,
para o reencontrar em outra esquina
de adeuses.
Estarei sempre de partida,
até o momento de sermos deuses:
quando me fizeres dar adeus à solidão
e à sombra.
(Em "Para não dizer adeus", 2005)
Guardei-me para Ti
Guardei-me para ti como um segredo
Que eu mesma não desvendei:
Há notas nesta guitarra que não toquei,
Há praias na minha ilha que nem andei.
É preciso que me tomes, além do riso e do olhar,
Naquilo que não conheço e adivinhei;
É preciso que me ensines a canção do que serei
E me cries com teu gesto
Que nem sonhei.
Ilhas
O que não posso dizer
o que não cabe em palavras
o que não é para olhares
profanos;
o que é calado e remoto
meu mais secreto destino
como o reverso das ilhas;
ar marinho maremoto
calado alado e sonoro:
mais que navego,
imagino.
("Coletânea de Poesia Gaúcha
Contemporânea." Organizador:
Dilan Camargo. Porto Alegre:
Assembleia Legislativa, 2013.
354 p. ISBN 978-85-66054-002.
Ex. bib. Antonio Miranda.
www.antoniomiranda.com.br/
poesia_brasis/
rio_grande_sul/
lya_luft.html)
Mar de Menina
Havia um mar,
e ali brotava uma ilha
povoada de lobos e de pensamentos.
Havia um fundo escuro e belo
onde os náufragos dançavam com sereias.
Havia ansiedade e abraço.
Havia âncora e vaguidão.
Brinquei com peixes e anjos,
fui menina e fui rainha,
acompanhada e largada,
sempre a meia altura
do chão.
A vida um barco, remos ou ventos,
tudo real e tudo
ilusão.
(Em "Para não dizer adeus",
2005, p. 37)
O Rio do Tempo
O tempo não existe,
nem dentro nem fora.
Esses peixes de opala
são nomes que nadam na memória:
são rostos. são risos, são prantos,
são as horas felizes.
O tempo não existe,
pois tudo continua aqui, e cresce
como se arredonda uma árvore
pesada de frutos que são peixes,
que são nomes, são rostos
com máscaras.
O tempo não existe. Sou apenas
o aqui e o presente, e o atrás disso,
como um rio que corre mas não passa
- pois ele é sempre, em mim, agora.
(Em "Para não dizer adeus", 2005)
Semântica
Não se enganem comigo:
se digo sul pode ser norte,
chego mas fico ausente,
o triste é também o belo,
procuro o que não se perde
nem se pode encontrar.
Buscar resposta nos livros
é esconder-se entre linhas.
Não creio no que se enxerga,
mas nisso que se disfarça
por mais que se tente olhar:
assim me tem seduzida.
Eis o jogo que eu persigo,
meu jeito de ser feliz,
o desafio que me embala:
sempre que escrevo "morte"
estou falando da vida.
(Em "Para não dizer adeus", 2005).
Tão Sutilmente em Tantos Breves Anos
Tão sutilmente em tantos breves anos
foram se trocando sobre os muros
mais que desigualdades, semelhanças,
que aos poucos dois são um, sem que no entanto
deixem de ser plurais:
talvez as asas de um só anjo, inseparáveis.
Presenças, solidões que vão tecendo a vida,
o filho que se faz, uma árvore plantada,
o tempo gotejando do telhado.
Beleza perseguida a cada hora, para que não baixe
o pó de um cotidiano desencanto.
Tão fielmente adaptam-se as almas destes corpos
que uma em outra pode se trocar,
sem que alguém de fora o percebesse nunca.
(do livro Mulher no Palco)
Fonte: www.escritas.org
Todas as Águas
Quando pensei que estava tudo cumprido
havia outra surpresa: mais uma curva
do rio, mais riso e mais pranto.
Quando calculei que tudo estava pago,
anunciaram-se novas dívidas e juros,
o amor e o desafio.
Quando achei que estava serena,
os caminhos se espalmaram
como dedos de espanto
em cortinas aflitas. E eu espio,
ainda que o olhar seja grande
e a fresta pequena.
(Em "Para não dizer adeus", 2005)
Um Anjo Vem
Um anjo vem todas as noites:
senta-se ao pé de mim, e passa
sobre meu coração a asa mansa,
como se fosse meu melhor amigo.
Esse fantasma que chega e me abraça
(asas cobrindo a ferida do flanco)
é todo o amor que resta
entre ti e mim, e está comigo.
Fonte Principal
E as outras fontes já citadas.
Pesquisa, seleção, revisões e edições por Euro Oscar.
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