
Poesias de JG de Araújo Jorge - Página 7

José Guilherme de Araújo Jorge (Tarauacá, Estado do Acre, 20 de maio de 1914 - Rio de Janeiro, 27 de janeiro de 1987), mais conhecido como J. G. de Araújo Jorge, foi conhecido como o "Poeta do Povo e da Mocidade", um dos mais lidos no Brasil. Ainda estudante venceu concursos de oratória. Foi estudar em Coimbra e em Berlim e também foi deputado federal. Sua obra lírica, de linguagem simples, é impregnada de romantismo moderno, às vezes dramático.
(Resumido e adaptado da Wikipédia)
Índice
Jardim Suspenso;
Meu Céu Interior;
Meu Coração;
Nevando;
No Último Convés;
Num álbum;
O Meu Primeiro Verso.
Jardim Suspenso
Ergui alto as colunas da imaginação
com o mármore da vida e com o cristal do sonho.
Sobre elas, fui plantar, para além da amplidão
o sonoro jardim dos versos que componho...
Jardim suspenso no ar por colunas de luz,
longe... longe do mundo e das cousas da terra...
- onde, por entre os versos todos que compus
a minha alma sonâmbula e encantada - erra...
Fiz deste meu jardim oculto, extraordinário,
onde os poemas tem voz como as águas das fontes,
o meu mundo feliz, mundo estranho e lendário
sem terras, sem fronteiras, homens e horizontes...
Aí... nas alamedas silenciosas, ando
sonhando, sem ninguém, sem leis, e até sem Deus!
Apenas tendo, alegre, ao meu redor, um bando
de pássaros que são os próprios sonhos meus...
...............................................
Felizes os que podem criar esta ascensão,
bater asas poeirentas pelo espaço imenso
e ir sonhar como eu vou nesse jardim suspenso
que ergui sobre as colunas da imaginação!...
Meu Céu Interior
Se esses teus olhos, no meu livro, imersos,
encontrarem diversas emoções,
- não tentes decifrar... – mil corações
nós os temos num só, todos diversos...
Os meus poemas aqui, vivem dispersos,
como as estrelas... e as constelações...
- no céu das minhas íntimas visões,
no "meu céu interior..." cheio de versos.
Não procures o poeta compreender...
- Os versos que umas cousas nos desnudam,
Outras cousas, ocultam, sem querer...
Uns, são felizes... Outros, ao contrário...
- No rosário da vida, as contas mudam,
e os versos são contas de um rosário!...
Meu Coração
Eu tenho um coração - um mísero coitado
ainda vive a sonhar... ainda sabe viver...
- acredita que o mudo é um castelo encantado
e criança vive a rir batendo de prazer...
Eu tenho um coração, - um mísero coitado
que um dia há de por fim, o mundo compreender...
- é um poeta, um sonhador, um pobre esperançado
que habita no meu peito e enche de sons meu ser...
Quando tudo é matéria e é sombra - ele é uma luz...
Ainda crê na ilusão... no amor... na fantasia...
- sabe todos de cor os versos que compus...
Deus pôs-me um coração com certeza enganado:
- e é por isso, talvez, que ainda faço poesia
lembrando um sonhador do século passado!...
Nevando
(Berlim, 10 de fevereiro de 1934)
Passa o vento agitando as árvores de leve
a tiritar de frio... E os flóculos de arminho
a caírem no espaço, as curvas do caminho
vão vestindo de branco e bordando de neve...
Tudo é claro... Pelo ar, as árvores, seus galhos
parecem levantar aos céus em aflição
implorando ao Criador a volta da estação
que as cobre com calor dos verdes agasalhos...
Cai a poeira do inverno... e tudo... lentamente
vai mudando... Do chão, se apagam, de repente
as passadas de alguém que por ali passou...
Quem me dera que a neve em minha alma caísse,
e apagasse também... ( e que ninguém mais visse...)
- os vestígios que nela teu amor deixou!...
No Último Convés
Eu sofro e enfermidade estranha do Sol-pôr,
meus olhos estão doendo de meditação
e a minha alma, distante, as distâncias percorre...
Esvaia-se a alma das cousas nesta tarde exangue
e o sol, longe, no céu, como uma flor de sangue
despetalando nuvens lentamente morre!
Aos meus olhos, o mar... o mar... o imenso mar
onde os primeiros astros trêmulos debruçam
os pistilos dourados de corola azul,
arrebentando espumas sob o inquieto açoite
de vento... e se entranhando à escuridão da noite
quando acendem no céu o Cruzeiro do Sul!
Mar que trago na cor dos meus olhos, ciganos,
que tem alma de poeta, coração de louco
e improvisa nas praias poemas e rumores...
Mar que ninguém compreende e que ninguém traduz
íris verde da terra, onde há sombra e onde há luz
como há sombra e há luz no olhar dos sonhadores!
Mar que um verde lençol, de inquietações repleto,
de horizonte a horizonte estende, sempre inquieto,
como se multidões lutassem no seu Ser...
Mar que vai conversar com a noite, lá distante,
a noite - o seu amor, a noite- a sua amante
que se enfeita de estrelas para o receber!
.................................................
Eu sofro e enfermidade estranha do Sol-pôr...
- Saudade - e invejo o oceano, e invejo o seu amor
pela noite, nessa hora em que fico a cismar...
Venho de longe, doente de saudades e sonho
e enquanto a ouvir o mar este verso componho,
minha alma é um búzio imenso onde canta outro mar!
Num álbum
Quando o tempo passar... mais tarde...quando a vida
transformar em saudade a lembrança querida
deste tempo de agora,
- esquece o teu olhar um segundo somente,
neste verso que fiz, guardando este presente
que aos poucos vai-se embora
Mais tarde... Sim, mais tarde...
Abrindo o teu caderno,
um terno sentimento... um sentimento terno
de tristeza hás de achar...
Como a flor que se pôs, num romance, perdida,
assim, encontrarás no teu, a minha vida
inteira, a se despetalar... (desfolhar)
O que agora te escrevo (digo), é tudo o que suponho,
- talvez seja - quem sabe - uma quimera...um sonho...
uma ilusão fugaz...
Pode ser que com o tempo esqueças o que eu digo,
ou talvez - que o caminho incerto onde hoje sigo
com o teu não cruze mais...
Eu só tenho um desejo: - é que encontres um dia
o teu sonho de moça - a feliz fantasia
da tua aspiração...
Sabendo-te feliz... Sentindo-te radiante...
Também eu, podes crer, feliz serei, distante,
de todo o coração
...............................................
Quando o tempo passar... mais tarde... no futuro,
um dia, sem querer, verás o velho muro
que existe no jardim...
Há nele alguma data - uma data passada-.
perdoa se a quiseres esquecer - coitada!
Foi gravada por mim...
Ela é a história feliz que um dia terminamos,
- ela guarda o primeiro beijo que trocamos,
numa noite em que o céu, era todo esplendor...
Não a tires do muro... ela é tudo entre nós...
Ao vê-la, só nós dois, intimamente, a sós,
havemos de lembrar, o nosso findo amor!...
O Meu Primeiro Verso
O meu primeiro verso, o verso meu primeiro
quando o fiz, não sei bem o que senti, no entanto
eu creio que chorei... chorei, creio, de espanto
sentindo-o por demais sincero e verdadeiro...
Deslumbrado e surpreso, eu o reli todo, inteiro,
na alegria feliz de ouvir meu próprio canto,
- depois, tendo no olhar as lágrimas do encanto
guardei-o como um velho amigo, um companheiro ...
Desde aquele momento, o céu ficou mais lindo!
O olhar deixei vagar por toda a natureza:
- como tudo mudou! (pensei, chorando e rindo).
E disse: - que esplendor encerra este Universo!
- Se Deus quis ser um Poeta, e fez tanta beleza,
o Poeta quis ser Deus e a traduziu num verso!
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Fonte dos Textos
"Meu Céu Interior", 1ª ed., set. de 1934.
Pesquisa, seleção, revisões e edições por Euro Oscar.
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